Com cerca de 75% da população europeia a viver em áreas urbanas, a maioria do consumo, produção de resíduos e emissões de gases com efeito de estufa ocorre nas cidades. Na visão das entidades europeias, as cidades devem, assim, ser vistas como berços circulares e ecossistemas nos quais são iniciadas e alimentadas soluções circulares para problemas e desafios prementes. Outra visão é de que podem ser catalisadores circulares, uma vez que podem criar uma visão e estratégia circulares, otimizar infraestruturas e redes logísticas, conectar stakeholders e dar incentivos e facilitar iniciativas circulares.
A cidade de Amesterdão – uma das precursoras desta visão – desenvolveu sete princípios guia da transição circular:
- Circuitos fechados – Todos os materiais são reutilizados e reciclados infinitamente;
- Emissões reduzidas – Toda a energia é gerada a partir de fontes renováveis;
- Geração de valor – Os recursos são utilizados para gerar valor partilhado (financeiro e social);
- Design modular – Todos os produtos são concebidos de forma modular e flexível e as cadeias de produção permitem a adaptabilidade dos sistemas;
- Modelos empresariais inovadores – Todos os novos modelos empresariais implementados permitem a transição da posse de bens para a utilização de bens através de serviços;
- Logística reversa orientada para a região – Os sistemas logísticos são transferidos para um serviço mais orientado para a região com capacidades de logística reversa;
- Modernização dos sistemas naturais – Todas as atividades humanas contribuem positivamente para os ecossistemas, os serviços ecossistémicos e a reconstrução do “capital natural”.
O caminho a ser feito a nível europeu
O Banco de Investimento Europeu desenvolveu o Circular City Centre (C3), um centro que pretende apoiar as cidades europeias na sua transição circular, através da partilha de recursos, informação prática, consultoria e sensibilização para oportunidades de aconselhamento e financiamento para projetos circulares.
Lançado em outubro de 2021, encontra-se em fase de piloto e tem o apoio da Comissão Europeia através do InvestEU Advisory Hub. Recorde-se que o programa InvestEU mobilizou mais de 500 mil milhões de euros entre 2015-2020 em investimentos e prevê mais de 372 mil milhões entre 2021 e 2027.
O C3 lançou este ano o documento “A guide for developing a circular city strategy”, onde explica como desenvolver uma estratégia, ao mesmo tempo que exemplifica o que várias cidades já estão a seguir.
Por exemplo, a definição de uma estratégia circular deve ter como o início a resposta a estas perguntas, sendo que o documento detalha o que envolve cada uma delas:
- Quem devem as cidades envolver no processo?
- Qual é o ponto de partida?
- Para onde deve a cidade direcionar a ação?
- Qual é a meta?
- Como pode atingir os objetivos?
- Como vai liderar, permitir e encorajar a transição circular?
- Como medir o progresso?
- Como e onde conseguir financiamento?
- Estruturar e compilar a estratégia
Existe ainda o Circular City Funding Guide, que providencia informação para os municípios, empresários e outros players que querem criar cidades sustentáveis e implementar projetos e iniciativas circulares. O guia está dividido em três partes: a economia circular no contexto urbano; os instrumentos e fontes de financiamento; como criar programas de financiamento.
Os exemplos em Portugal
O documento “A guide for developing a circular city strategy” faz um retrato geral do planeamento existente nas várias cidades europeias, destacando os exemplos de Lisboa (com o plano “Lisbon: the first EU Green Capital in Southern Europe” apresentado em 2020) e do Porto (com o Circular Roadmap for the City of Porto in 2030 apresentado em 2017).
Já o Circular City Funding Guide destaca a cidade de Lisboa entre os case studies no seu site, apoiado pela cidade ter sido em 2020 a primeira Capital Verde Europeu no Sul da Europa, após um caminho iniciado durante a crise económica de 2008.
O guia nota que a cidade decidiu focar-se em seis setores chave (construção, energia, alimentação, mobilidade, resíduos e água) e selecionou projetos circulares que poderiam reduzir os gastos públicos. Lisboa identificou custos elevados relacionados com a utilização da água para fins públicos, como a rega de espaços verdes e a lavagem de ruas.
O Circular City Funding Guide destaca ainda que a cidade obteve financiamento europeu para dois projetos no domínio dos resíduos:
Force – Copenhaga, Hamburgo, Génova e Lisboa juntaram-se para minimizar os vazamentos de materiais. Lisboa focou-se especificamente nos resíduos biológicos e alimentares, tendo desenvolvido uma aplicação para estimular a prevenção dos resíduos alimentares e para a separação de fontes de bioresíduos.
URBAN WASTE– Este projeto europeu apoiou sete cidades turísticas no desenvolvimento de estratégias para reduzir a geração de lixo municipal e encorajar a reutilização e reciclagem.
Mais recentemente, em 2022, a empresa Águas do Tejo Atlântico, em parceria com a Câmara Municipal de Lisboa, lançou o projeto Água+ para utilizar a água reciclada nos espaços verdes da cidade.