Circularidade

Foi descartada roupa suficiente para encher 200 estádios olímpicos em 2024, concluiu estudo

Foi descartada roupa suficiente para encher 200 estádios olímpicos em 2024, concluiu estudo iStock

Em 2024, foram descartadas 120 milhões de toneladas de roupa, o equivalente a encher 200 estádios olímpicos. Do total, 80% teve como destino aterros ou incineração, enquanto apenas 12% foi reutilizada e 7% classificada como apta para reciclagem.

A conclusão é do estudo “Spinning Textile Waste into Value”, da Boston Consulting Group (BCG), que avançou ainda que este cenário representa uma perda anual de 150 mil milhões de dólares em matérias-primas.

O estudo sublinhou ainda que o problema tem dimensão global e resulta de vários fatores combinados: desde 2000, a produção de fibras duplicou, impulsionada pelo aumento dos rendimentos, pelo consumo em massa e pela diminuição do número médio de utilizações por peça.

Em paralelo, os custos ambientais da moda atingiram níveis críticos: a produção de têxteis é responsável por 92% das emissões de gases com efeito de estufa do setor. Queimar uma tonelada de roupa gera emissões equivalentes a seis voos de ida e volta entre Londres e Nova Iorque, enquanto o envio da mesma quantidade para aterros representa o impacto de oito voos. Além disso, o descarte incorreto intensifica a libertação de microplásticos nocivos no ambiente.

O relatório alertou também para a urgência de transformar a indústria da moda numa economia circular, através de um esforço conjunto de marcas, investidores, inovadores e consumidores. O objetivo é torná-la mais competitiva e resiliente, enquanto gera benefícios significativos e duradouros para o ambiente e para a sociedade.

Barreiras e oportunidades para a circularidade da moda
Apesar da urgência, a análise sublinhou que o setor enfrenta obstáculos que dificultam a recuperação do valor anual estimado em 150 mil milhões de dólares, nomeadamente:

  • Preço: fibras recicladas mantêm-se mais caras do que fibras virgens, em parte porque os custos ambientais destas últimas não estão refletidos no preço de mercado;
  • Infraestruturas limitadas: os sistemas de recolha e triagem existentes foram concebidos sobretudo para revenda de roupa em segunda mão, não para reciclagem, e não conseguem responder ao volume crescente de resíduos;
  • Tecidos complexos: a maioria das peças combina fibras naturais e sintéticas, que as tecnologias atuais de reciclagem mecânica ainda não processam de forma eficaz em escala industrial.

Ainda assim, a oportunidade é “clara”: com os investimentos adequados, a taxa de reciclagem poderá superar os 30%, gerando fibras recicladas avaliadas em mais de 50 mil milhões de dólares e criando cerca de 180 mil novos empregos.

Neste sentido, o estudo da BCG propõe um conjunto de ações estratégicas para desbloquear este potencial e transformar o setor. Entre as principais medidas estão:

  1. Estimular a procura por fibras recicladas, incentivando as marcas a integrar materiais sustentáveis nas coleções;
  2. Expandir a recolha de resíduos, através de programas de devolução em lojas, pontos de recolha locais e sistemas públicos;
  3. Modernizar a triagem, recorrendo a tecnologias como inteligência artificial, robótica e espectroscopia, capazes de duplicar a capacidade de processamento;
  4. Escalar a reciclagem, com investimento em fábricas industriais aptas a processar tecidos mistos;
  5. Fomentar a inovação, por meio de estratégias coordenadas de financiamento, como consórcios para partilha de riscos e benefícios no apoio a startups.

O relatório sublinhou também que a regulação será decisiva. Na União Europeia (UE), a diretiva de Responsabilidade Alargada do Produtor (RAP) obriga os produtores a assumir os custos da gestão dos resíduos dos seus produtos. Países como os Países Baixos já adotaram esta política como parte central da sua estratégia de economia circular têxtil, com metas ambiciosas: até 2030, 75% dos têxteis colocados no mercado deverão estar preparados para reutilização ou reciclagem.

Além disso, os consumidores também têm um papel central nesta transformação. Campanhas de sensibilização, como a francesa #RRRR – reduzir, reutilizar, reparar e reciclar, que em 2022 alcançou mais de 52 milhões de pessoas, mostram que a mobilização social pode acelerar a mudança. Tornar a reciclagem de roupa tão simples quanto a de garrafas de plástico será decisivo para criar um novo ciclo de valor.

Por fim, o estudo concluiu que o futuro da moda depende da capacidade de transformar resíduos em recursos. Marcas que adotem a circularidade como estratégia central estarão mais preparadas para gerir riscos, ganhar a confiança dos consumidores e gerar impacto positivo para a sociedade e o ambiente.

 

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