Mais de 85 cientistas norte-americanos e internacionais denunciaram um relatório da administração Donald Trump que descreve como “exagerada” a ameaça das alterações climáticas, afirmando que o documento está repleto de “erros, deturpações e dados escolhidos a dedo” para servir a agenda política do atual presidente dos Estados Unidos da América (EUA).
Os investigadores apresentaram a sua crítica durante o período de consulta pública do relatório, que terminou esta terça-feira, dia 2 de setembro. O documento, publicado em julho e elaborado por cinco académicos escolhidos pelo secretário da Energia do governo americano, Chris Wright, reconhece que o planeta está a aquecer, mas sustenta que as alterações climáticas seriam “menos prejudiciais economicamente do que se acredita”.
Os investigadores acusam a administração de Trump de ter usado o estudo para justificar o anúncio da revogação dos limites às emissões de gases com efeito de estufa (GEE) resultantes da queima de combustíveis fósseis. Chris Wright defendeu o trabalho, acusando os críticos de evitarem um debate profundo sobre o tema.
A contestação ao relatório foi liderada por Andrew Dessler, professor de ciências atmosféricas na Universidade Texas A&M, que coordenou um relatório de 439 páginas em resposta ao documento oficial do governo dos EUA.
“O objetivo deles era baralhar as águas, lançar um argumento plausível para o debate público que faça parecer que não sabemos se as alterações climáticas são más ou não”, afirmaram os cientistas, acrescentando que o relatório se trata de “uma paródia de um campo científico fundamental e já escrutinado”.
O estudo governamental foi ainda criticado pela American Meteorological Society, que apontou “falhas estruturais” e pediu a sua correção. Entre os problemas detetados estão definições incorretas, citações erradas e simplificações abusivas.
O professor Cyrus C. Taylor, físico na Case Western Reserve University, denunciou mesmo ter detetado gráficos manipulados, referindo-se nomeadamente a um gráfico que omitia dados-chave para minimizar a subida do dióxido de carbono.
Outros cientistas, cujos trabalhos foram citados no relatório, disseram ter sido mal interpretados. Antonio Gasparrini, da London School of Hygiene and Tropical Medicine, reconheceu que há mais mortes por frio do que por calor, mas acusou o relatório de ignorar que as alterações climáticas estão a aumentar rapidamente as mortes ligadas a ondas de calor.
Também Pamela D. McElwee, da Universidade Rutgers, criticou a falta de rigor do documento, sublinhando que, na sua ótica, trata-se de “puro desleixo”, enfatizando que o relatório citava um artigo científico de 2023 que não existe.
Apesar das críticas, o relatório já está a ser usado pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA, na sigla em inglês) para apoiar a revogação de regras que limitam emissões de dióxido de carbono, reforçando os receios de que a negação climática ganhe espaço no processo legislativo norte-americano.