Um novo estudo, publicado na revista Nature, estabeleceu, pela primeira vez, uma ligação direta entre as emissões das maiores empresas de combustíveis fósseis e dezenas de ondas de calor fatais em todo o mundo.
A investigação é já considerada um “salto em frente” na luta para responsabilizar juridicamente a indústria petrolífera pelos danos provocados pela crise climática.
Os investigadores analisaram 213 ondas de calor entre 2000 e 2023 e concluíram que as emissões das 14 maiores empresas de combustíveis fósseis, por si só, tornaram mais de 50 destas ondas de calor praticamente inevitáveis. No caso da ExxonMobil e da Saudi Aramco, a probabilidade de ocorrência de 51 eventos extremos foi multiplicada por 10.000 face a um cenário sem aquecimento global.
“Ser capaz de monitorizar a contribuição destes grandes emissores e quantificá-la pode ser muito útil para estabelecer responsabilidade legal”, afirmou a professora Sonia Seneviratne, da ETH Zurich, autora do estudo.
Segundo os dados, o aquecimento global tornou as ondas de calor 200 vezes mais prováveis na última década e aumentou a sua intensidade média de 1,4 °C (2000-2009) para 2,2 °C (2020-2023).
“As alterações climáticas tornaram cada uma das 213 ondas de calor mais provável e mais intensa, e a situação tem vindo a agravar-se”, referiu Yann Quilcaille, coautor do estudo.
O estudo pretende servir como base para ações judiciais, especialmente após decisões recentes de tribunais internacionais que reconhecem a possibilidade de compensação por falhas na prevenção de danos climáticos.
“Aqui está a prova que os tribunais estavam à espera. A fatura está a chegar, e é altura de os poluidores pagarem pelos danos que causaram”, afirmou Cassidy DiPaola, porta-voz da campanha Make Polluters Pay.
Ainda assim, especialistas jurídicos alertam para os desafios que permanecem. “O novo estudo é mais um bloco de construção importante, mas o caminho para a responsabilização efetiva continua cheio de obstáculos legais e probatórios”, enfatizaram o professor Michael Gerrard e Jessica Wentz, do Sabin Center for Climate Change Law da Universidade de Columbia.
O estudo recorreu à análise de atribuição, que compara o clima atual com o período anterior à utilização massiva de combustíveis fósseis para medir o impacto das emissões no aumento das temperaturas, utilizando dados meteorológicos e modelos computacionais.
Os cientistas calcularam primeiro quanto as emissões de cada grande emissor contribuíram para o aumento das temperaturas e depois avaliaram como esse aquecimento elevou a probabilidade de ocorrência de ondas de calor. Embora estudos anteriores já tivessem associado eventos isolados ao aquecimento global, este é o primeiro a analisar de forma sistemática uma série de ocorrências.