A Associação Sistema Terrestre Sustentável (ZERO) contesta o Governo pelos fracos progressos no que toca a colocar em marcha a estratégia da Lei de Bases do Clima.
De acordo com a ZERO, “a associação mostra-se apreensiva, pois, em suma, os progressos são medíocres: estamos praticamente a meio da década crítica para conseguirmos limitar o aquecimento global a cerca de 1,5°C, em que as emissões de gases com efeito de estufa têm de baixar drasticamente até 2030, quer no mundo quer no país, mas a lei marca passo”.
Dois anos depois da entrada em vigor da Lei, a Associação apresenta um panorama geral da sua evolução, classificando as medidas pela prioridade no que respeita ao progresso com as cores de semáforo.
Medidas no vermelho:
O Conselho para a Ação Climática foi promulgado em agosto de 2023, com previsão de início no passado dia 1 de janeiro de 2024, no entanto, de acordo com a Associação, “já era tarde”.
E continua: “a data não foi cumprida e na atual conjuntura política – que não justifica o incumprimento – esta estrutura só deverá estar constituída daqui a vários meses. A sua operacionalização é vital, pois trata-se de um órgão consultivo e independente que superintenderá a aplicação da lei, e do qual dependem importantes dispositivos nela contidos, por si só também em atraso por esse e outros motivos”.
O Conselho ficaria responsável pelos Orçamentos de Carbono, que estabelecem limites quinquenais de emissões de gases de efeito de estufa para o país, no entanto, de acordo com a ZERO, estes limites não existem para o período atual até 2025 nem para 2025-2030 e adiante que “este atraso é preocupante, na medida em que é fundamental conhecer estes limites para se ajustar a ação climática em concordância”.
Segundo a Associação, no vermelho, está também a apresentação dos planos setoriais de mitigação e de adaptação às alterações climáticas para os setores considerados prioritários e do relatório de avaliação inicial de impacte climático legislativo, mas que também já ultrapassou o prazo definido.
A ZERO alerta ainda para o prazo, prestes a terminar (a 1 de fevereiro de 2024), relativamente à Estratégia Industrial Verde, um documento que pretende efetuar uma transição energética mais rápida, justa e sustentável, e que, de acordo com a Associação, “deveria ter sido apresentado muito antes do prazo devido à sua extrema relevância. Visto esta estratégia necessitar de parecer prévio por parte do Conselho para a Ação Climática e devido a outros motivos de atraso, antevê-se que a estratégia estará apta a ser iniciada só daqui a um ano”.
A Lei de Bases do Clima prevê ainda o término da subsidiação aos combustíveis fósseis até 2030, no entanto, no entender da ZERO Portugal “não tem dado passos nesse sentido – antes pelo contrário, mantém, por exemplo, a suspensão parcial da atualização da taxa sobre as emissões de CO2 no imposto sobre produtos petrolíferos (ISP)”.
Outra medida presente na Lei, que a Associação considera estar no vermelho, é a restrição da produção e comercialização de combustíveis ou biocombustíveis que contenham óleo de palma ou outras culturas alimentares insustentáveis, que tinha já um prazo definido de término e foi considerada no Orçamento de Estado de 2021, no entanto, segundo a ZERO, “não só não se deu a sua efetivação, como nunca mais foi considerada nos orçamentos subsequentes”.
Medidas no amarelo:
De acordo com o comunicado da ZERO, no laranja mantém-se “a falta de clareza quanto ao enquadramento da participação pública, que ocupa um lugar central na lei, e que deve incluir os cidadãos, as associações de ambiente e o tecido empresarial no planeamento na tomada de decisões e avaliação das políticas públicas climáticas”. A Associação informa que para este efeito existe uma ferramenta digital disponível no portal “Mais Transparência”, que consiste “numa mera secção do site referente à transparência governamental intitulada ´ação climática´”.
Para a ZERO, a informação é importante, mas “meramente informativa e expositiva, perdurando a inexistência de um canal de comunicação exclusivo que possibilite a participação ativa de todos na ação climática”.
Também no laranja, a Associação considera estarem os planos regionais e municipais para a ação climática, que a Lei estipula como data-limite para aprovação o dia 1 de fevereiro de 2024. Para isto, a ZERO explica que “este planeamento constitui um importante mecanismo para a adequação da ação climática à realidade e contexto dos territórios locais. Contudo, a falta de apoio por parte do governo central às autarquias na elaboração destes planos, quer ao nível financeiro, quer ao de recursos humanos técnicos adequados, traduz-se na impossibilidade de apresentação do plano por parte da maioria dos municípios”.
Medidas no verde:
De acordo com o comunicado da ZERO, “muito a conta gotas, alguns dispositivos passaram ao verde, mas cuja efetivação não estava diretamente sob a alçada do Estado, como é o caso do relatório anual sobre a exposição ao risco climático do setor financeiro e segurador, a ser apresentado pelo Banco de Portugal e a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF)”.
Também o relatório de avaliação do impacte carbónico da atividade e funcionamento da Assembleia da República foi publicado recentemente, em que são identificadas as medidas a adotar para mitigar aquele o impacto carbónico. A ZERO acrescenta que “apesar do atraso na sua divulgação e da parca informação que contém, é de louvar o esforço por parte da Assembleia na sua elaboração, servindo este documento como um importante ponto de partida para o caminho que tem de ser feito para este órgão governativo alcançar a neutralidade climática até 2025, conforme a lei prevê”.
Em suma, a ZERO concluiu que “muito pouco foi feito nestes dois últimos anos, e a maioria das medidas na Lei de Bases do Clima persiste no vermelho ou amarelo, sendo particularmente gravosas as omissões relativas aos orçamentos de carbono, ao relatório de avaliação inicial de impacte climático e aos planos setoriais de mitigação e de adaptação às alterações climáticas, todos na gaveta sem data prevista de apresentação”.
E acrescenta: “estes atrasos na implementação da Lei de Bases do Clima prejudicam fortemente o correto planeamento e execução da política e ação climática nacional, atrasando medidas urgentes para concretizar as transformações estruturais necessárias para que Portugal acelere o passo e consiga alcançar a neutralidade climática até 2045”.