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Aumentar o ‘hinterland’ significa melhorar a economia

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O futuro passa por encarar os portos como parte integrante de uma plataforma logística, com uma estratégia integrada ao nível das acessibilidades (nomeadamente a ferrovia) e um aumento substancial da captação do negócio local: fixar indústria, aumentar os serviços e incrementar a eficiência.

Os portos são parte fundamental para o desenvolvimento da economia nacional. mas isso só acontece se fizerem parte de uma estratégia integrada, a par das entidades oficiais, dos players da logística, dos vários modos de transporte e em comunhão com a região onde estão inseridos. Só desta forma é possível disponibilizar soluções competitivas, desenvolver o hinterland ibérico e conquistar negócio. No entanto, para que isso aconteça há que melhorar diversos aspetos, com a parte das acessibilidades, nomeadamente em termos de ferrovia, a ganhar destaque.

O tema é tão vital que foi alvo de uma dupla atenção por parte da ADFERSIT. Primeiro num webinar, realizado em outubro, e depois como parte integrante do 14.º Congresso Nacional. Para poder debater o tema foram ouvidos os principais intervenientes no negócio, quer da parte dos portos em si, mas também das empresas de transportes, sejam estas vocacionadas para o transporte marítimo ou rodoviário, ou mesmo representantes de associações de empresas.

No que concerne ao futuro do porto de Sines, José Luís Cacho, presidente do Conselho de Administração dos Portos de Sines e Algarve, apontou a necessidade de encontrar novas áreas de negócio, de captar mais carga de hinterland e o conseguir desenvolver projetos de investimento na zona de carga local, ou seja, captar novos projetos industriais e logísticos para as ZILS. Sem esquecer, é claro, a melhoria das infraestruturas rodoviárias e ferroviárias, para que o porto consiga ter uma maior penetração no hinterland ibérico.

Desatar nós
Falar em portos é pensar em nós, devidamente integrados na cadeia logística. é desta forma que devem ser encarados e planeados. “Num interface entre o mar e a terra”, como refere José Luís Cacho e fazendo parte de uma logística que deve ser vista, cada vez mais, de uma forma integrada. Ou seja, devemos abandonar a visão passada dos portos, onde estes eram meros pontos onde eram descarregadas mercadorias, para serem considerados como verdadeiras plataformas logísticas. Sendo que José Luís Cacho acredita que a digitalização vai acelerar esse processo de integração.

Por muito que se tente evitar o transporte rodoviário o certo é que ele é necessário.

Sem barcos não existem portos. Mas também é verdade que nem todos os portos são iguais. Seja pela localização, pela infraestrutura existente, pelos serviços existentes ou pelos preços praticados. Questionado sobre os critérios usados pela MSC na seleção dos portos, Marco Vale, managing director da MSC, afirmou que o fator mais importante reside na eficiência da solução logística que o porto apresenta. Que está intimamente interligada ao potencial de crescimento do hinterland desse mesmo porto. Falando da especialização “contentores” Marco Vale referiu que existem dois eixos centrais para o crescimento de um terminal de contentores: o transbordo ou transhipment – atividade que não depende da dimensão do mercado local nem da situação económica do país. Trata-se de uma atividade que depende, “apenas e só, da eficiência do terminal e, no global, da competitividade do porto em si”. Sendo que esta depende em grande parte da eficiência logística, quer ao nível da agilização das operações, como da coordenação de entidades do porto em si e com o terminal. Essa não dependência da dimensão e situação económica do país onde o porto está localizado é vantajoso a Portugal. E a prova é que entre 2012 e 2103 – período em que o país atravessou uma profunda crise económica – o transhipment, no Porto de Sines, teve o maior crescimento de sempre. “No espaço de um ano cresceu mais de 100%”, constatou o executivo da MSC, que acrescentou que Sines tem uma grande vantagem: a localização. Isto porque está no cruzamento das grandes rotas comerciais atlânticas, a que se alia os fundos naturais, de cerca de 17 metros, que permite a entrada e saída de navios de grandes dimensões. Aqui há que acrescentar que “poucos portos no mundo têm fundos naturais desta profundidade”. Analisando o caso específico de Sines, Marco Vale refere que o porto necessita de crescer e ganhar escala, por forma a estar em concorrência com os grandes portos ibéricos.

A carga local é, segundo o executivo da MSC, o segundo eixo de desenvolvimento de um terminal de contentores. “É a hinterland, a captação de cargas que esse porto consegue fazer”. Sendo que aqui é necessário pensar a nível ibérico. “Hoje em dia a MSC Portugal já capta carga da zona de Sevilha”, exemplifica Marco Vale. O que significa que há importadores e exportadores da zona de Sevilha que usam o porto de Sines. Mas há possibilidades de chegar mais longe. Marco Vale acredita que, com algum trabalho, é possível chegar ao mercado de Madrid. Isto tendo em conta a nova ligação ferroviária, prevista para Elvas, poderá, segundo cálculos feitos pela empresa há alguns anos, reduzir entre 30 e 40% o custo do transporte de mercadorias até à fronteira. Redução que permitirá chegar aos importadores/exportadores de Madrid com uma solução mais competitiva do que os praticados pelos portos de Valência e Algeciras, que atualmente “alimentam” a capital espanhola.

Mas isso só será possível (diga-se, conseguir crescer na área do hinterland) se forem trabalhadas as acessibilidades rodoviárias e ferroviárias. E isso é algo que anda a ser falado há décadas. Trata-se de uma solução que “peca por ser tardia”. Essa e o facto de o porto de Sines não ser servido por uma autoestrada. Porque, por muito que se tente evitar o transporte rodoviário o certo é que ele é necessário.

A ferrovia pode contribuir, de forma decisiva, para a expansão do hinterland dos portos, que se querem ibéricos.

Subindo para o Norte Marco Vale falou do porto de Leixões, que há anos que está nos limites da sua capacidade, referindo que o mesmo “faz maravilhas com as condições que tem”. Sobre a expansão de Leixões o executivo questiona-se se não será mais vantajoso uma aposta nas acessibilidades marítimas no porto de Aveiro. Isto porque o plano de expansão do porto de Leixões “não contempla uma forte componente ferroviária”. E isso é importante, principalmente se Leixões quiser conquistar o mercado da Galiza. Porque “nunca seremos competitivos a fazer 500 quilómetros de camião”.

Vários portos, muitos serviços, diversos transportes
Equacionando o futuro, num cenário em 2030, em que compararia Aveiro e Leixões em pleno funcionamento, ou uma solução em que só teremos Leixões, “penso que seria mais benéfico, para o país, termos dois portos de média/grande dimensão a funcionar, porque Aveiro tem tudo, basta melhorar as acessibilidades marítimas – que também têm de ser melhoradas no porto de Leixões”.

Há ainda um outro eixe de desenvolvimento, mas a nível local, refere Marco Vale, apontando a importância, não só para a economia da região, mas também para o aumento da eficiência do porto: a criação de serviços acessórios, instalados dentro do próprio porto.

Para Vítor Enes, diretor-geral de BD da Luís Simões, o segredo está em ter uma visão articulada de todos os meios de transporte. E alerta para o facto de que as plataformas logísticas vão ter de estar mais perto do consumo. Com o crescimento do comércio eletrónico “temos de ter o produto mais perto do consumidor”. Isto porque “o consumidor quer receber todos os dias, quer receber muitas vezes no próprio dia ou em 24 horas”, acrescentou, apontando Barcelona como um bom exemplo (a observar).

A ferrovia pode contribuir, de forma decisiva, para a expansão do hinterland dos portos, que se querem ibéricos. Esta é a opinião de Carlos Vasconcelos, presidente do conselho de administração da Medway. Mas não basta ter ferrovia. Ela tem de ser competitiva, oferecendo soluções eficientes de logística, de transporte, de distribuição, recolha e outros serviços complementares. Mas, principalmente, e é isso que hoje falha, “precisa de ter uma rede ferroviária, que lhe permita fazer comboios rápidos, de 750 metros que possam circular em Portugal e Espanha”. Só desta forma conseguirá oferecer soluções competitivas, em termos de custos. Enquanto não existir esta rede a ferrovia nunca servirá como fator de expansão dos portos.

Os portos nacionais têm demonstrado um bom nível de crescimento. Mas, mesmo assim, ainda há muito por fazer. O aspeto mais crítico é consensual: as acessibilidades.

Em termos de prioridades relacionadas com a ferrovia Carlos Vasconcelos aponta a eletrificação das linhas, eliminação das restrições à circulação dos comboios de 750 metros, eliminação das pendentes que impedem a utilização máxima da capacidade de tração e eliminação dos constrangimentos de acesso aos portos. A nível internacional o executivo da Medway lembra a importância da linha Elvas/Badajoz na redução do tempo de transporte dos produtos entre os portos nacionais e o hinterland espanhol.

Os portos nacionais têm demonstrado um bom nível de crescimento. Mas, mesmo assim, ainda há muito por fazer. O aspeto mais crítico é consensual: as acessibilidades. Com especial incidência na criação de uma rede ferroviária que permita encurtar o tempo de transporte das mercadorias e permita disponibilizar soluções competitivas em termos de custo. E esta é uma preocupação a nível nacional e não apenas de um porto, embora, no caso de Sines, seja crítica a ligação a Espanha. Por outro lado, a digitalização, desde que bem orquestrada, vai ajudar a automatizar processos e a facilitar o atenuar de “tempos mortos”, aumentando a eficiência dos portos e auferindo-lhes uma maior competitividade no panorama internacional. Porque se o transhipment é importante, os portos não se podem esquecer do hinterland, nomeadamente o ibérico. Porque é este que potencia o negócio local, fixa pessoas e indústria.

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