Mortes relacionadas com o calor, insegurança alimentar e disseminação de doenças infeciosas causadas pela atual crise climática atingiram níveis recordes em 2023. É a conclusão do relatório anual da Lancet Countdown sobre saúde e alterações climáticas.
De acordo com a investigação, a população mundial enfrenta ameaças sem precedentes à sua saúde devido às rápidas mudanças climáticas, com a expansão da utilização dos combustíveis fósseis e as emissões recordes de gases com efeito de estufa (GEE) a agravarem os impactos na saúde e a ameaçarem reverter o progresso já feito.
“O balanço deste ano das ameaças iminentes à saúde revelou as descobertas mais preocupantes até agora”, alertou Marina Romanello, diretora-executiva do Lancet Countdown da University College London.
E continua: “mais uma vez, o ano passado quebrou recordes no que toca a alterações climáticas com ondas de calor extremas, eventos climáticos mortais e incêndios florestais devastadores que afetaram pessoas em todo o mundo. Nenhum indivíduo ou economia no planeta está imune às ameaças à saúde devido a estes eventos devastadores”.
O relatório concluiu ainda que, em 2023, a seca extrema com duração de pelo menos um mês afetou 48% da área terrestre mundial, com as populações a terem de lidar com 50 dias a mais de temperaturas ameaçadoras à saúde do que seria esperado sem a crise climática. Como resultado, mais 151 milhões de pessoas enfrentaram insegurança alimentar moderada ou grave, correndo o risco de desnutrição e outros danos à saúde.
As mortes relacionadas com o calor entre os maiores de 65 anos dispararam 167% em 2023, em comparação com a década de 1990. Sem a crise climática, o envelhecimento da população mundial significa que essas mortes teriam aumentado, mas apenas 65%. As altas temperaturas também levaram a um recorde de 6% mais horas de sono perdidas em 2023 do que a média de 1986-2005.
A manifestação de um clima mais quente e seco levou a um maior número de tempestades de areia e poeira, o que contribuiu para um aumento de 31% no número de pessoas expostas a concentrações perigosamente altas de material em partículas. Enquanto doenças potencialmente fatais, como a dengue, a malária e o vírus do Nilo Ocidental, se continuaram a espalhar para novas áreas como resultado de temperaturas mais altas.
Mas, apesar disso, “os governos e empresas continuam a investir em combustíveis fósseis, o que resulta em elevadas emissões de gases com efeito de estufa e a perda impressionante de árvores, reduzindo as oportunidades de sobrevivência das pessoas em todo o mundo”, enfatizam os autores do estudo.
Em 2023, as emissões globais de dióxido de carbono (CO2) relacionadas com a energia atingiram um recorde histórico: 1,1% acima de 2022, e a proporção de combustíveis fósseis no sistema energético global aumentou, pela primeira vez, numa década durante 2021, atingindo 80,3% de toda a energia.
Respondendo às descobertas desta investigação, o Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), afirmou que “a crise climática é uma crise de saúde. À medida que o planeta aquece, a frequência e a intensidade dos desastres relacionados com o clima também aumentam, não deixando nenhuma região intocada”.
Em função destas conclusões, também António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, referiu que “as emissões recordes representam também ameaças recorde à nossa saúde. Devemos curar a doença da inação climática – reduzindo as emissões, protegendo as pessoas dos extremos climáticos e acabando com o vício em combustíveis fósseis, de forma a criarmos um futuro mais justo, seguro e saudável para todos”.
De acordo com os autores do estudo, “as alterações climáticas não são uma ameaça distante, mas sim, um risco atual e imediato para a saúde da população mundial”.